O aeroporto de Ushuaia é menor que uma rodoviária, mas é tão fofinho, todo trabalhado na madeira, que chega a ser aconchegante. A calefação cria a doce ilusão de que a vida é bela e morninha, mas aí você se posiciona em frente à porta de saída, espera ela abrir automaticamente e... bem-vindo ao refrigerador Electrolux tamanho gigante ligado na potência máxima! Saca “Debi & Lóide” com a melequinha congelada? A sensação é essa. Mas não reclamo não, gente! É muito divertido! Sair dos 38 graus do Rio e chegar a -1 (sem contar o vento glacial) é coisa de doido! Tipo no domingo eu estava na praia e, na quarta, com três meias, duas calças, quatro casacos, duas luvas, cachecol e gorro.
O albergue, Freestyle, fica escondidinho numa rua perto do centro e é muito bom! Quartos com pouca gente, banheiro no quarto, uma copinha tb e o melhor de tudo: o chão é aquecido. Cara, dá vontade de dormir no chão, de afagar o chão, de não sair do chão. Quero um desses na minha casa!
Como a cidade é bem pequena, assim como nosso tempo de viagem, resolvemos fazer um passeio bacana por dia. O escolhido de hoje foi o famoso passeio de barco pelo Canal de Beagle. Reservamos pelo albergue, mas é tranqüilo de chegar no porto, escolher uma das agências, pagar e embarcar. Vários argentinos no nosso barco (aliás, isso é muito maneiro. Os argentinos viajam muito pelo próprio país – coisa que eu não faço muito, confesso), um guia fanfarrão gente boa, chocolate quente, chá (chimarrão) e... PUTA QUE PARIU! QUE FRIO FAZ NAQUELA MERDA!!!!!! Sério, o frio deu de um milhão a zero nos cariocas cheios de marra que não levaram as baixas temperaturas a sério. Praticamente impossível sair de dentro da cabine aquecida, mas aí a gente releva isso e dá um pulinho lá fora pra ver de perto o Faro Les Eclesieures (que marca a entrada da Baía de Ushuaia), as colônias de cormorones (aves) e os leões marinhos, que são muuuuuuuuito fofinhos, brincam, jogam toda a sua banha nas pedras, dormem de barriga pra cima e fazem uns barulhos esquisitos. Apaixonei profundamente! Uma pena os amigos pinguins não estarem lá essa época.
Coisas que não entendo: 1) uma criatura que ficou todo o tempo na parte de fora do barco, se deliciando com aquele friozinho que congela a alma. Os músculos da face não moviam um milímetro. Não é possível que não estivesse sofrendo. Ele TINHA que estar sofrendo. Segundo o Vlad, lembrava o Michael Jackson; 2) tudo bem que é costume e tal, mas como pessoas que não se conhecem e não sabem a procedência umas das outras botam a boca no mesmo canudinho de chimarrão? E sapinho? E herpes? E só o nojinho, não basta?
Pouco antes do fim do passeio, que dura umas 4 horas, o barco para numa ilha e o povo sai pra caminhar e conhecer a história dos povos que viviam ali e se alimentavam de mariscos (os fósseis comprovam). Foi onde o frio atingiu seu ápice. Casaco de lã parecia camiseta. Quem fizer esse passeio, por obséquio, vá de casaco impermeável. Grata.
À noite andamos pela cidade (ok, pela Av. San Martin, que é a principal) e, por indicação do “Ras” (abreviação de “rasta”), o maluco rastafári da recepção do hostel, vencemos o frio com uma deliciosa sopinha de abóbora com parmesão num restaurante fofo chamado “Sabores patagônicos”. E ainda aprendi que abóbora em espanhol é calabaza. Porque eu perguntei pro garçom o que significava aquilo no cardápio e ele foi lá no Google do caixa pra conseguir traduzir: “Abobôra”, ele disse. Fofo.
Beijo na calabaza.