De Calafate à geleira são 80km de distância. Mais ou menos uma hora de viagem com paisagens inacreditáveis de deserto, neve e as águas verdes do Lago Argentino. Coisa linda de Deus. Reservamos o passeio na véspera, diretamente na Hielo y Aventura, agência responsável pelas excursões e que fica na avenida principal da cidade, bem facinho de encontrar. O ônibus da empresa busca e depois deixa todo mundo na porta dos hoteis. Pudera. Esse foi o passeio mais caro de toda a viagem. Mas valeu a pena cada centavinho.
Chegamos ao parque nacional (com entrada que se paga à parte, lá na hora, 75 pesos pra estrangeiros) e, numa paradinha estratégica para aquele pip’s emergencial, adivinha quem encontramos? Aquela belíssima família de Ushuaia, toda trabalhada na feiúra, gente! Ai, que susto! Hahaha! Bom, aí mais à frente a turistada desce toda do ônibus e pega um barco. E nesse caminho eu já estava me sentindo o Amir Klynk, navegando por águas gélidas, pequenos icebergs e muitos pedacinhos de gelo. E eis que ele surge, o Perito, ainda ao longe, mas já imponente. E quanto mais nos aproximávamos e íamos percebendo a extensão do bicho, mais impressionante se tornava. O povo do barco alternava momentos de silêncio contemplativo com alguns “Ooooohhhh!!!” de completa perplexidade.
A caminhada começa ainda em terra, por uma trilha no bosque que leva ao glaciar. Aquela vontadezinha quase incontrolável de sair correndo e me jogar naquele gelo todo, nossa! Mas antes tem que calçar os “crampones”, aqueles sapatos com a sola cheia de pinos que proporcionam a aderência de nossos lindos pezinhos na neve. O guia também dá uma aulinha rápida sobre os princípios básicos dos crampones (pés sempre afastados, passos firmes, desça com passinhos curtos, suba com pés abertos feito pinguim). Fácil, não?
Não. O gelo aqui é duro. Muito mesmo. Não é aquela neve fofa que a gente usou pra fazer bonequinho no Glaciar Martial. É um gelo antigo. Segundo o guia, a neve da parte frontal do Perito Moreno (a que se desprende constantemente) tem entre 300 e 500 anos!! E que a altura da parede, contando a parte que está submersa, é equivalente à de um prédio de 20 andares! Ou seja, Morenão não está de brincadeira. Gente, e o vento? Caraca! Um vento que quase me derrubava quando eu parava pra tirar uma foto. Então o guia vai moldando escadinhas nas partes mais íngremes e todos têm que andar em fila. Eu era a penúltima da fila e, numa dessas, passei por uma ladeirinha cheia de pedrinhas de gelo soltas e confesso que quase realizei minha vontade de beijar o chão. Os crampones não se fixaram na neve, um pé ficou muito perto do outro, os grampos da sola rasgaram a barra da calça (detalhe: alugada!), o coração veio na boca e... eu fiquei lindamente em pé, que nem Diega Hipólyto no fim da apresentação, porque eu sou ninja, cara! Tá achando o quê? Uma moça com excesso de massa corporal não conseguiu fazer a caminhada porque mal conseguia subir a escada pra entrar no ônibus. Mas eu, logo eu, não poderia pagar esse mico e me estatelar naquela imensidão branca. Morenão ficou orgulhoso de mim.
Mas tirando esse pequeno susto, o mini trekking foi uma experiência única. Toda a minha falta de jeito com os sapatos, aquela quantidade tão grande de gelo tão perto de mim, o contraste com o céu, a água que ficava entre as fendas e era de um azul tão magnífico que parecia photoshop, todos os desenhos que o gelo formava, tudo parecia tão irreal que até agora eu duvido que estive realmente lá. Foi ótimo ficar andando toda errada enquanto os guias davam passos enormes, cheios de ginga e desenvoltura. Ah, e ainda celebramos o fim da jornada com um copo de whisky e gelo retirado adivinha de onde? Dali mesmo. Hehehe.
Antes de voltar a Calafate, paramos nas diversas plataformas de observação do glaciar (mais altas, mais baixas, mais próximas, mais distantes...), perfeitas para se ter uma noção um pouquinho maior do tamanho do Morenão. Gente, e que morenão!!! Ai, como era grande!! E ali, de frente praquela paredona azul e branca, presenciamos o desprendimento de um pedação de gelo, que mergulhou na água em câmera lenta logo após um estrondo que parecia trovão. Aí a coisa ficou muito mais divertida porque, a cada estrondo, a gente já buscava em toda a extensão da parede frontal a parte que estava caindo. Esses desprendimentos acontecem o dia inteiro, mas toda hora que víamos dava vontade de pular e ficar apontando que nem criança quando vai ao zoológico pela primeira vez.
Foi tanta emoção que dormi a viagem inteira até Calafate. E assim, lindos, aventureiros e felizes, comemoramos a bênção de conhecer um lugar tão bonito por natureza com uma comidinha sensacional no La Vaca Atada (La Vaca Atolada, segundo o Vlad), restaurante fofo e com o garçom mais simpático e sorridente de toda a Patagônia. Delícia de cordeiro (vale a pena experimentar!) e tiramisu. Huuuuuuummmm...
Beijo, Morenão.
Um comentário:
Delícia o jeito que você escreve. Vou passar o fim do ano no fim do mundo (Ushuaia/El Calafate) e anotei suas dicas. Obrigada.
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